03/04/09

MIMI NINAPENDA KISWAHILI SANA*

Hoje foi o meu último dia de aulas de Swahili. Ao todo fizemos um curso intensivo de 54h, ao longo de quatro semanas e foi uma experiência extraordinária. Para mim, que gosto de línguas, foi particularmente interessante porque além de ser um desafio novo, a aprendizagem da língua permitiu-me conhecer melhor a cultura local. Foi também um bocadinho esquizofrénico aprender uma língua nova tendo por referência uma outra língua que não a minha língua materna (o inglês, neste caso) e falado com uma pronúncia que eu dificilmente entendo (a do Quénia). Agora já me safo melhor mas no início “Dásdei” não me parecia nada “Thursday”, “Gál” não me soava a “girl” e “uád” parecia tudo menos “word” e tudo se complicava quando uma frase inteira como “insáted in the midáu ovauád” não me soava nada a “inserted in the middle of a word”. Claro que o meu inglês com pronúncia britânica (segundo os locais, claro) também não soava familiar ao Mr. Musyoka (nosso ilustre professor, intelectual, linguista, conselheiro sentimental e pastor). Valeu-nos a preciosa ajuda da Julie, a minha colega de curso, que é canadiana e serviu de intérprete. E valeu-nos sobretudo a boa disposição pois muito nos rimos ao longo destas semanas de aulas. Já agora, por falar de pronúncias, devo dizer que falar Swahili é fácil para qualquer tripeiro ou tripeira bem falante. Estamos habituados a abrir as vogais e a pronunciá-las bem... e isso é fundamental. Claro que com a gramática a história é outra, pois a língua, de raiz bantu, com 30 por cento de palavras árabes, não se parece com nada... mas já lá iremos. A própria escola é um lugar especial, uma espécie de babilónia onde se aprendem todas as línguas bantu do Quénia, e ainda inglês, francês e espanhol e onde, portanto se encontram pessoas dos quatro cantos do mundo, com os mais diversos interesses na vida e as mais diversas profissões. Para mim foi particularmente útil porque conheci pessoas que estão a aprender línguas locais para irem trabalhar nas várias regiões do país e agora tenho contactos de muita gente junto das comunidades que me interessa estudar. A escola tem também a melhor esplanada das redondezas, instalada num belo jardim, onde me habituei a tomar o pequeno-almoço todos os dias, onde fiquei viciada em mandazi (doce, pouco doce, local) e onde baralhava os neurónios dos empregados sempre que pedia “Kahawa bila maziwa, tafadahali” (café sem leite, por favor!).

Cinquenta e quatro horas de aulas pode parecer muito pouco para aprender uma língua nova, particularmente difícil, mas o facto é que esta foi a minha principal tarefa este mês e o professor era mesmo bom, o que significa que aprendi toda a estrutura da língua e muito vocabulário e agora só me falta praticar (o que é muito difícil em Nairobi, pois as pessoas querem mostrar que dominam o inglês), mas que vai acontecer dentro de uma semana quando me mudar para o Monte Quénia.

Sobre o kiswahili e sobre quem o fala descobri coisas fascinantes. Por exemplo, gostei particularmente do significado de “mtafiti” (investigador) que se traduz literalmente “perguntador”, depois há a questão do verbo “to have” que não significa “ter” pois não existe o conceito de propriedade, mas sim “estar com”, que implica transitoriedade. Ou seja, nada nos pertence, apenas estamos com as coisas, por exemplo, durante algum tempo. A questão das horas e da divisão do dia tira do sério qualquer ocidental porque em swahili o relógio é diferente, as horas contam-se com outra lógica e o dia tem 8 partes muito bem definidas. Sendo um país atravessado pelo Equador, o Quénia tem 12h de dia e 12h de noite e a vida activa rege-se pela luz do dia. Assim, a primeira hora do dia, é a primeira hora de actividade, ou seja as 7h da manhã. Entre as 6h e as 7h é “alfariji” a aurora, altura em que as pessoas se preparam para a actividade na primeira hora. Quando se pergunta as horas, se forem, por exemplo, 8h da manhã para nós, em swahili são 2h (a segunda hora do dia) e por aí em diante. Esta parte é de doidos!

Também é bonito, no meio desta cacofonia de sons estranhos aparecerem palavras emprestadas como “limau”, “meza”, “daktari”, “wiki”, “komputa”, “eropleni”... (limão, mesa, doutor, week, computador, aeroplano”.

O Swahili é uma língua muito harmoniosa em que tudo tem de concordar com tudo através de um esquema complexo de prefixos, sufixos e partículas que formam palavras de quilómetros que integram pronomes, marcadores temporais, verbos, adverbios de lugar etc. Por exemplo, isto escreve-se tudo junto: ni (eu) + na (particula do verbo fazer) + wa (gerúndio) + andiki (verbo escrever) + eni (tu) = ninawaandikieni = estou a escrever-te (I'm writing to you)... fácil, Humm?

Interessante também é o facto de só existirem 5 cores em swahili (preto, branco, vermelho, verde e azul) todas as outras são composições destas cores básicas como cor-de-rosa = ekundu eupe (vermelho e branco).

Tenho muito que aprender e que praticar e se calhar mais tarde nesta aventura, se tiver tempo, volto às aulas para fazer um curso intermédio.

Entretanto, no meio da cacofonia swahiliana há expressões que soam melhor que outras “Mimi ninakupenda sana” (amo-te muito) não me parece lá muito romântico, ao passo que “Mimi ninalala” (vou dormir), a minha preferida, me parece deliciosa!.


*Eu gosto muito de Swahili.

4 comentários:

Unknown disse...

Bem, sensacional esta tua "aula" de Swahili, diria mesmo que deves propor JÁ lol a abertura dum Seminário de Swahili pro Doutoramento, pena que não possas ser tu a dá-lo!
A sério: mt educativo este teu blog, mas parece-me, assim à distância, uma complicação fenomenal, talvez por não ser uma língua tão "teórica", mas baseada na oralidade e na vivência do dia-a-dia e que exige um entendimento prévio da população que a usa. Mas, sim senhor, os meus parabéns pelo curso e sua finalização, com certeza, com louvor! Não sabes a sorte que tens por andares aí nas tuas aventuras e aprendizagens enquanto que a genti cá está num stress danado!
Bjs e bom fim-de-semana!

African Queen disse...

Rakel
É mesmo uma complicação fenomenal LOL, mas é fascinante.
Quanto ao blogue até gostava que fosse mais educativo, sabes... há muitos assuntos que eu gostava de aprofundar, reflectir e partilhar como as lutas estudantis, as tensões tribais, o peso das religiões, o follow up da crise pós-eleitoral etc. Mas para já estou a viver, a aprender, a observar. O mundo está cheio de gente cheia de opiniões repentinas. Eu preciso de tempo para amadurecer e depois sim, poder falar/escrever sobre os assuntos com alguma honestidade.
Por isso, por enquanto o blogue é mais sobre mim do que sobre o Quénia... mas quero equilibrar esta equação :).
Beijinhos!! e volta sempre.

Márcia Marques disse...

Olá! "Karibu!"
Estava à procura de material sobre kiswahili no google e 'topei' com o seu blog! Eu faço aulas de kiswahili na USP, somos uma turma bem pequena. Recentemente criei um blog para que possamos divulgar e dar continuidade ao estudo dessa língua maravilhosa, o blog ainda é muito recente precisa ser aprimorado! Fiquei feliz em encontrar alguém que compartilhe esse sentimento pela língua, "mimi ninapenda kiswahili pia!"
Sucesso

Anónimo disse...

What a great web log. I spend hours on the net reading blogs, about tons of various subjects. I have to first of all give praise to whoever created your theme and second of all to you for writing what i can only describe as an fabulous article. I honestly believe there is a skill to writing articles that only very few posses and honestly you got it. The combining of demonstrative and upper-class content is by all odds super rare with the astronomic amount of blogs on the cyberspace.